segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

TEORIA DA CAUSA MADURA

A APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA NO ÂMBITO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - Fernando Natal Batista

Publicado em JAN de 2012.

Fernando Natal Batista

Graduado em Direito pela Universidade de Brasília (1998),

Professor do Centro Universitário de Brasília.
Submissão: 07.01.2011
Parecer 1: 24.02.2011
Parecer 2: 06.04.2011
Decisão Editorial: 06.04.2011

RESUMO: Estudo sobre a aplicação da teoria da causa madura, prevista no art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil, aos recursos ordinários e especiais submetidos à competência constitucional do Superior Tribunal de Justiça. Exposição da análise doutrinária e jurisprudencial do tema proposto.

PALAVRAS-CHAVE: Processual civil; aplicação; teoria da causa madura; competência recursal; Superior Tribunal de Justiça.

ABSTRACT: Study on application of theory of the mature case under article 515, paragraph 3, of the Code of Civil Procedure, to the ordinary and special appeals within the constitutional jurisdiction of the Superior Court of Justice. Exposure of the doctrinal and jurisprudential analysis of the proposed topic.

KEYWORDS: Civil procedure; application; theory of the mature case; recursal jurisdiction; Superior Court of Justice.

SUMÁRIO: Introdução ; 1 Comentários à teoria geral dos recursos e à reforma processual de 2001 ; 2 A aplicação da teoria da causa madura no âmbito do Superior Tribunal de Justiça ; Conclusão ; Referências .


INTRODUÇÃO

Os recursos, enquanto meios de impugnação decisória, são previstos e regulados nas legislações infraconstitucionais, sejam eles extraordinários ou não, de modo a atender aos anseios do jurisdicionado na busca da realização da justiça com maior acuidade.


Pretende-se, no presente trabalho, retratar a plausibilidade de aplicação restrita da teoria da causa madura, contida no § 3º do art. 515 do Código de Processo Civil - CPC (acrescido pela Lei nº 10.352/2001 ), no âmbito dos recursos adstritos às competências originária e ordinária do Superior Tribunal de Justiça - STJ.

Para tanto, far-se-á inicialmente necessário, em breves apontamentos, entender o cenário de formulação e publicação da citada reforma processual, para, após, examinando a competência recursal desta Corte Superior, posicionar-se o estudo favorável à aplicação limitada deste novel instituto de direito processual no âmbito deste sodalício.

Serão estudados, ainda que sucintamente, os requisitos próprios e delimitadores da aplicação do disposto no art. 515, § 3º, do CPC, para melhor compreensão do tema.

Não obstante, também será retratada e abordada, por meio de citação de julgados, a existência de uma divergência comprovada entre os órgãos julgadores do STJ quanto à possibilidade ou não de aplicação da teoria da causa madura aos recursos por eles julgados.

Metodologicamente, como o trabalho tem por escopo a tentativa de firmar um pensamento jurídico coerente, servimo-nos das experiências de outros autores, citados ao final, nas referências, para prover uma construção doutrinária própria e, assim, melhor exteriorizá-la. Outrossim, em razão da finalidade proposta, são trazidos ao conhecimento público os arestos resgatados na base de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

1 - COMENTÁRIOS À TEORIA GERAL DOS RECURSOS E À REFORMA PROCESSUAL DE 2001

Caracterizam-se os recursos por serem anteriores à coisa julgada, não constituindo nova relação processual, e por sua voluntariedade, ou seja, dependem da manifestação inequívoca do jurisdicionado em haver reexaminada a decisão judicial pelo próprio órgão judicial ou de grau superior.

A legislação pátria prevê a existência de duas modalidades de recursos: o ordinário, que visa a tutelar o direito subjetivo daquele que recorre; e o extraordinário, cujo objetivo é a proteção do próprio direito objetivo (a lei ou a constituição) e, por via indireta, a tutela do direito subjetivo.

Em razão da possibilidade de revisão da decisão judicial, confiada a um órgão jurisdicional de hierarquia superior na ordem judiciária, surgiu, no ordenamento jurídico, o princípio do duplo grau de jurisdição. Tal corolário é uma garantia a mais ao cidadão de que a justiça pública visionará a certeza em suas decisões, resguardando o direito individual violado ou resistido.

Tem-se, portanto, como principal efeito dos recursos a devolutividade da matéria litigiosa, porquanto, como visto, não inauguram nova relação processual.

O alcance do efeito devolutivo, no entanto, determina-se pela extensão da impugnação: o recorrente somente pode impugnar com seu recurso aquilo que foi efetivamente deliberado; o âmbito da devolução fica, por tais razões, restrito, não se admitindo que o Tribunal aprecie questões estranhas aos limites do julgamento recorrido ( tantum devolutum quantum apellatum).

Resumindo, nos dizeres do professor Fredie Didier Júnior, “significa precisar o que se submete, por força do recurso, ao julgamento do órgão ad quem”11

1. DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil. 7. ed. Salvador: JusPodivm, v. 3, 2009. p. 83.

Todavia, a ampla recorribilidade de toda decisão judicial (final ou interlocutória), como preleciona Humberto Theodoro Júnior, tornou-se, “sem dúvida, o grande embaraço com que se depara o intento renovador do processo civil brasileiro”22

2. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Inovações da Lei nº 10.352/2001, em matéria de recursos cíveis e duplo grau de jurisdição. In: NERY JÚNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: RT, 2002. p. 263.

O advento da Lei nº 10.352/2001 almejou, assim, tornar a prestação jurisdicional mais simples e célere, minimizando os malefícios do decurso temporal da espera, mitigando o duplo grau de jurisdição, permitindo ao Juízo ad quem julgar o mérito da ação extinta sem julgamento de mérito pelo Juízo a quo, nos casos em que se discutiram apenas questões de direito.

É, aliás, o que se extrai da leitura do próprio dispositivo em comento:

Art. 515. A apelação devolverá ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

[ Omissis]

§ 3º Nos casos de extinção sem julgamento de mérito (art. 267), o Tribunal pode desde logo julgar a lide, se a causa versar sobre questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.

Nesse sentido, inclusive, é a lição de Fredie Didier Júnior:

Advertem, entretanto, que o princípio do duplo grau de jurisdição, conquanto de cunho constitucional, comporta limitações, cujo exemplo está no § 3º do art. 515 do CPC , que permite ao Tribunal, no julgamento de apelação interposta contra sentença terminativa, conhecer diretamente do mérito, dês que a causa verse exclusivamente sobre questão de direito e esteja pronta para julgamento; nesse caso, mesmo não havendo apreciação da matéria meritória pelo primeiro grau, é permitido que o órgão ad quem analise o mérito, intocado por aquele.

A nova redação legal do citado artigo, contido no capítulo atinente ao recurso de apelação, inovou, por conseguinte, ao prever explicitamente a possibilidade de o Tribunal julgar o mérito da ação quando o juiz de direito não o fez. Tal modificação, realizada pelo legífero, pretendeu conferir maior celeridade ao processo e concretude ao comando do art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal .

Este, inclusive, é o pensamento do Professor José Carlos Barbosa Moreira33

3. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil - Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, v. V: artigos 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 432.

Modificou substancialmente tal regime a Lei nº 10.352, ao acrescentar ao art. 515 o § 3º, a cuja luz pode ocorrer, agora, que uma sentença meramente terminativa venha a ser substituída por acórdão relativo ao meritum causae. Ampliou-se o efeito devolutivo da apelação e, do mesmo passo, tornou-se inevitável a revisão das ideias correntes acerca do princípio do duplo grau de jurisdição - que, repita-se, não está definido em texto algum nem tem significação universal fixada a priori: seu alcance será aquele que resulta do exame do jus positum, e, portanto, discutir se o infringe ou não disposição legal como a que ora se comenta é inverter os termos da questão.

Nesse particular, frise-se, ainda, que deve ser respeitado o princípio da correlação ou congruência entre o pedido e o provimento (pelo qual o juízo não pode conceder senão o que foi pedido - arts. 128 e 515, ambos do Código de Processo Civil ), de modo que, se o recorrente somente buscou a cassação da decisão recorrida, o Tribunal deve, uma vez revertida a decisão monocrática, devolver os autos ao Magistrado de origem, para que este aprecie a questão de mérito, sob pena de incorrer em julgamento extra petita.

Amadureceu, então, da interpretação doutrinária da alteração legislativa a teoria da causa madura (também conhecida por técnica de julgamento per saltum ou de aplicação do direito à espécie), cuja inovação peculiar consistiu em quebrar a tradição do processo civil brasileiro, que não admitia aos Tribunais enfrentarem o mérito da causa, em grau recursal, quando a sentença recorrida fosse terminativa.

O julgamento do mérito da causa pelo Tribunal de segundo grau, nos termos do art. 515, § 3º, do CPC , não se limita às questões exclusivamente de direito, mas alcança, outrossim, aquelas cuja instrução probatória esteja completa ou seja desnecessária, de acordo com a convicção do julgador. É, portanto, o que se convencionou chamar de “causa madura”, ou seja, pronta para julgamento, à semelhança do que ocorre com o julgamento antecipado da lide.

A regra, todavia, não é absoluta ou tampouco pode ser indiscriminadamente aplicada, sendo forçoso respeitar as suas próprias delimitações expressamente previstas, mormente o aperfeiçoamento do contraditório no âmbito da ação originária.

Preservou-se, igualmente, o corolário da segurança jurídica, cuja importância é ainda mais valiosa ao sistema processual do que a presteza na entrega da tutela jurisdicional.

Tal advertência, acrescente-se, é muito bem delineada pelo Mestre Humberto Theodoro Júnior44

4. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., p. 269.

Com a nova regra, mesmo que a sentença tenha sido terminativa, o efeito devolutivo da apelação permitirá ao Tribunal julgar o mérito da causa, desde que satisfeitos dois requisitos: a) se a causa versar sobre questão exclusivamente de direito; e b) o feito estiver em condições de imediato julgamento (um recurso contra o indeferimento da inicial, por exemplo, não pode ser apreciado pelo mérito da causa, porque ainda não se realizou o contraditório; assim, também quando a extinção se deu na fase de saneamento, sem que ainda se pudesse ter o contraditório como completo).

Não basta, portanto, que a questão de mérito de decidir seja apenas de direito: é necessário que o processo esteja maduro para a solução do mérito da causa. Mesmo que não haja prova a ser produzida, não poderá o Tribunal enfrentá-lo no julgamento da apelação formulada contra a sentença terminativa, se uma das partes ainda não teve oportunidade processual adequada para debater o mérito.

Com efeito, não se pode, de forma alguma, olvidar que o órgão ad quem, para aplicá-la e decidir o que o Juízo a quo não decidiu, necessitará se certificar de que houve oportunidade para oferecimento do contraditório e da ampla defesa, sob pena de macular o processo, ferindo visceralmente os princípios constitucionais que o norteiam.

Assim, com a introdução do § 3º no art. 515 do Código de Processo Civil , passou, portanto, a existir permissivo legal expresso autorizador do julgamento do meritum causae pelo Tribunal de Justiça, mesmo quando o Juízo singular não o tenha feito.

Ademais, estando prevista compartimentalmente no capítulo do recurso de apelação (próprio dos Tribunais ordinários), a aplicação da teoria da causa madura, como se verá a seguir, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, ganha outros contornos ainda mais restritivos.


2 - A APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA NO ÂMBITO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Como é sabido, a competência recursal do Superior Tribunal de Justiça é constitucional, sendo-lhe atribuídos o processamento e o julgamento de recurso ordinário (em sede mandamental) e do recurso especial, cuja natureza é excepcional.

Em relação ao recurso ordinário constitucional, inexiste tecnicamente qualquer empecilho à aplicação do art. 515, § 3º, do CPC , porquanto ele possui, por força legislativa, a mesma natureza jurídica e o mesmo rito procedimental do recurso de apelação, conforme o disposto no art. 34 da Lei nº 8.038/1990 .

O recurso ordinário constitucional tem a finalidade de permitir um segundo grau de jurisdição às ações mandamentais que são processadas originalmente nos Tribunais. Como não está limitado ao prequestionamento de possível violação à norma de direito infraconstitucional, provoca a prestação jurisdicional dos Tribunais Superiores como Cortes judiciais de segundo grau, conforme adverte Bernardo Pimentel Souza55

5. PIMENTEL SOUZA, Bernardo. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 561.

Logo, desde que respeitados os seguintes critérios: a) o recurso verse sobre questão exclusivamente de direito, sem a necessidade de dilação probatória; b) a ação originária tenha sido terminativamente; c) o exercício do contraditório; e, d) haja o recorrente formulado o pedido de apreciação de mérito, aplica-se a técnica de julgamento per saltum ao recurso ordinário constitucional.

Nesse sentido, trago à colação a valiosa lição dita com profunda propriedade sobre o tema pelo Ministro Teori Albino Zavascki66

6. Brasil. Superior Tribunal de Justiça, RMS 15.877/DF, 1ª T., Data de publicação: 21.06.2004; RePro, v. 119, p. 187.

O recurso ordinário contra acórdão que denega mandado de segurança de competência originária dos Tribunais, previsto no art. 105, II, b, da Constituição , tem natureza e função semelhantes ao recurso de apelação. O nível de cognição por ele propiciado ao STJ é em tudo semelhante ao atribuído aos Tribunais de apelação quando examinam os recursos interpostos em face das sentenças de primeiro grau. Segundo precedente deste STJ:

“O recurso ordinário em mandado de segurança é apelo que possui natureza similar à apelação, devolvendo ao Tribunal o conhecimento de toda a matéria alegada na impetração, independentemente de eventual análise pelo Tribunal de origem, principalmente quando se tratar de matéria de ordem pública, que pode ser reconhecida a qualquer tempo.” (STJ, AgRg-RMS 12.415/RJ, 5ª T., Rel. Min. Gilson Dipp, J. 27.08.2002)

Não é por outra razão que o CPC estabelece, em seu art. 540 , que ao recurso ordinário constitucional devem ser aplicados os mesmos requisitos de admissibilidade e o procedimento no Tribunal de origem previstos para o recurso de apelação. Ora, se o sistema é esse, não há razão lógica ou jurídica para negar ao STJ, ao apreciar aquele recurso, a faculdade prevista pelo § 3º do art. 515 do CPC . Impõe-se, por isso mesmo, sua aplicação por analogia.

Corroborando esse posicionamento, podem-se elencar, a título de ilustração, os seguintes precedentes:


ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - REGRA DO ART. 515, § 3º, DO CPC - APLICAÇÃO POR ANALOGIA - PRECEDENTES DO STJ - AGRAVO IMPROVIDO
1 - O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, presentes os pressupostos do art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil , aplicável por analogia, pode, em recurso ordinário em mandado de segurança, apreciar o mérito da impetração.
2 - Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg-RMS 23.777/RS, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 23.06.2008)

PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - TERCEIRO PREJUDICADO - CABIMENTO - SÚMULA Nº 202/STJ - PROCESSO EXTINTO SEM O JULGAMENTO DO MÉRITO - ART. 515, § 3º, DO CPC - APLICAÇÃO POR ANALOGIA - LIMINAR - DEFERIMENTO - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - NULIDADE DA DECISÃO
De acordo com a Súmula nº 202 do STJ , “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso”.
Aplica-se, por analogia, o art. 515, § 3º, do CPC ao recurso ordinário em mandado de segurança, viabilizando, por conseguinte, a apreciação do mérito do writ, desde que este não tenha sido instruído com complexo conjunto de provas, a exigir detalhado exame.
Não obstante o art. 165 do CPC admita a motivação sucinta, tal concisão não se confunde com a ausência de fundamentação, inviabilizadora do amplo exercício do direito de defesa.
É nula a decisão concessiva de liminar que se limita a dizer estarem presentes os requisitos autorizadores da concessão, sem, no entanto, discorrer em que consiste o fumus boni iuris e qual o periculum in mora.
Recurso provido. (STJ, RMS 25.462/RJ, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 30.10.2008)


ADMINISTRATIVO - PROCESSO CIVIL - ESCOLTA DE PRESOS - POLÍCIA CIVIL X POLÍCIA MILITAR
1 - O Sindicato e a Associação dos Policiais Civis têm direito líquido e certo de verem dirimida pelo Judiciário a questão da divisão de suas atribuições, pela confusão que reina em razão das atribuições da Polícia Militar.
2 - Afastado o óbice da impropriedade da via eleita e que extinguiu o processo sem exame do mérito, pode o STJ, com respaldo no art. 515, § 3º, do CPC , examinar o mérito do mandamus.
3 - As Polícias Civil e Militar têm atribuições específicas estabelecidas em lei estadual.
4 - A escolta de presos para apresentação à Justiça é geralmente atribuição da Polícia Militar, o que também ocorre no Estado de Minas Gerais, por força da Lei Estadual nº 13.054/1998.
5 - Recurso ordinário provido. (STJ, RMS 19.269/MG, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJU 13.06.2005)



Todavia, reside na apreciação do recurso especial, em razão de seus peculiares contornos, a impossibilidade, segundo a minha compreensão, de se aplicar essa técnica célere de julgamento recursal pelo Superior Tribunal de Justiça.

Sua origem, para alguns doutrinadores, é extraída do direito comparado, precisamente do recurso de cassação espanhol, fundamentando-se como instrumento hábil a impugnar decisão jurisdicional que afronta ou inobserva a aplicação de lei federal77

7. CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso especial, agravos e agravo interno. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 6.

O recurso especial previsto no art. 105, inciso III, da Constituição Federal - CF possui natureza extraordinária, sendo destinado à preservação da unidade e da autoridade do direito federal. E, por ser um meio de impugnação restritivo, sua finalidade estará adstrita tão somente à quaestio iuris, não servido para a revisão das questões fáticas, conforme nos ensina Hermann Homem de Carvalho Roenick88

8. ROENICK, Hermann Homem de Carvalho. Recursos no código de processo civil. Rio de Janeiro: Aide, 1999. p. 164.

Tem como pressuposto de admissibilidade peculiar a necessidade de prequestionamento, que consiste na prévia invocação pela parte da questão a ser decidida ou apreciada pelo Tribunal local.

Quanto ao tema, adverte o Professor Alexandre Freitas Câmara que até mesmo as questões de ordem pública (tais como as condições da ação e os pressupostos recursais) devem ser prequestionadas na origem para que possam ser apreciadas em sede de recurso especial99

9. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. 2, 2007. p. 140.

E, de fato, esta é a orientação jurisprudencial do STJ:


AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA - NECESSIDADE DE PREQUESTIONAMENTO - AUSÊNCIA DE TRASLADO DE PEÇA OBRIGATÓRIA - CÓPIA NÃO EXTRAÍDA DOS AUTOS ORIGINAIS
I - Prevalece nesta Corte o entendimento de que as questões de ordem pública, embora passíveis de conhecimento de ofício nas instâncias ordinárias, não prescindem do requisito do prequestionamento.
II - O agravo de instrumento deve ser instruído com cópias extraídas dos autos originais, sem as quais ficam desatendidas as exigências legais de correta formação do instrumento.
Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg-Ag 1.113.394/MT, 3ª T., Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe 26.06.2009)



Assim, em primeiro lugar, não tendo sido prequestionada a aplicação da técnica de julgamento per saltum, não pode o Superior Tribunal de Justiça, sob pena de ferir o princípio da demanda, avançar na apreciação de outras matérias não decidas na origem, sob pena de supressão de instância.

Nesse sentido é o posicionamento do Ministro José Delgado1010

10. Brasil. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-REsp 346.663/MG, 1ª T., Data de publicação: 04.03.2002.


O art. 515 e seus parágrafos do CPC não têm aplicação nesta instância derradeira. Para apreciação de qualquer questão envolvida na lide, a parte tem que ofertar recurso especial com pedido específico e que esteja o mesmo esculpido nas hipóteses do art. 105, III, da CF .



Confiram-se, ainda, os seguintes precedentes:




PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - LICENCIAMENTO AMBIENTAL - SUSPENSÃO DE ATIVIDADES - LICENÇA DE OPERAÇÃO OBTIDA APÓS INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO - FATO NOVO SUPERVENIENTE (ART. 462 DO CPC) - ALEGAÇÃO EM SEGUNDO GRAU - POSSIBILIDADE - TEORIA DA CAUSA MADURA - INAPLICABILIDADE
1 - A licença operacional - exigida pelas instâncias ordinárias como condição para continuidade das atividades do recorrente - foi obtida pela empresa após a interposição do agravo de instrumento, constituindo fato novo superveniente, nos termos do art. 462 do CPC .
2 - É assente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é possível a alegação de fato novo superveniente em sede de segundo grau (precedentes: REsp 847.831/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 14.12.2008; EDcl-REsp 487784/DF, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJe 30.06.2008; e AgRg-REsp 1059503/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 06.10.2008).
3 - Inaplicabilidade da teoria da causa madura em sede de recurso especial, ante a necessidade de prequestionamento da matéria tida como violada.
Recurso especial conhecido e provido em parte, com retorno dos autos à instância a quo para que examine a questão superveniente, nos termos do art. 462 do CPC, da forma que entender de direito. (STJ, REsp 1.089.986/RS, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, DJe 04.05.2009)


PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL - TRIBUTÁRIO - COMPENSAÇÃO EM AÇÃO MANDAMENTAL - ART. 515, § 3º, DO CPC : INAPLICABILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL
1 - O art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil é inaplicável em sede de recurso especial, por força do requisito do prequestionamento.
2 - Precedentes: EDcl-REsp 786.724/SP, DJ 07.08.2006; EDcl-REsp 524889/PR, DJ 22.05.2006; REsp 723918/RN, DJ 20.06.2005; EDcl-EDcl-REsp 70609/SP, DJ 12.08.1996.
3 - Agravo regimental parcialmente provido, determinando-se o retorno dos autos à Corte a quo, para que aprecie o pedido de compensação tributária formulado pela ora agravada. (STJ, AgRg-REsp 988.034/DF, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJe 08.10.2008)



PROCESSO CIVIL - FGTS - LEVANTAMENTO - COMPETÊNCIA: JUSTIÇA DO TRABALHO OU JUSTIÇA FEDERAL (SÚMULA Nº 82/STJ)
1 - Discussão em torno de questão prejudicial representada pelo não acertamento da relação de trabalho entre o empregado e o empregador (Município de Mossoró), da qual teria surgido o direito ao depósito nas contas vinculadas do FGTS, que, em princípio, atrairia a competência da Justiça do Trabalho.
2 - Tratando-se, não obstante, de pedido de pagamento das quantias que haviam sido depositadas na conta vinculada e que foram posteriormente devolvidas pela CEF ao Município, a pedido deste, em razão da nulidade do contrato de trabalho, e partindo-se do pressuposto que o entendimento pacificado pelo Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que o salário pelas horas de trabalho realizado é a única parcela devida em razão de contrato de trabalho firmado com ofensa à regra do concurso público (art. 37, II, da CF/1988) (Enunciado nº 363/TST), tem-se a incidência da regra do art. 20 da Lei nº 8.036/1990 , sendo obrigatório o depósito dos valores correspondentes na conta vinculada.
3 - Situação que se assemelha à hipótese em que o levantamento encontra resistência por parte do Conselho Curador ou da gestora, a Caixa Econômica Federal, cuja competência para processar e julgar a ação é da Justiça Federal, a teor da Súmula nº 82/STJ .
4 - Na ausência de julgamento em última ou única instância pelo Tribunal de origem quanto à matéria de fundo, conforme exigência do art. 105, III, da CF/1988 , impossível o julgamento do mérito do recurso especial, devido à sua natureza eminentemente técnica, que inviabiliza a aplicação do art. 515, § 3º, do CPC nesta instância superior.
5 - Recurso especial provido parcialmente. (STJ, REsp 723.918/RN, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 20.06.2006)
Concluindo, nas palavras do ilustre Ministro João Otávio de Noronha, em razão do procedimento processual específico do apelo especial, especificamente no que toca aos pressupostos recursais, não há como conferir aplicação, na instância excepcional, ao preceito inscrito no art. 515, § 3º, do CPC , que regula propriamente o recurso ordinário de apelação1111

11. Brasil. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-Ag 631.139/SP, 2ª T., DJU 29.08.2005.



Em segundo lugar, ao examinar o recurso especial, o STJ não está autorizado a prosseguir no julgamento do mérito da causa, mesmo se tratando de questão meramente de direito, sob pena de transformar-se em terceira instância.

Com efeito, na ausência de julgamento em última ou única instância pelo Tribunal de origem quanto à matéria de fundo, conforme exigência expressa do art. 105, inciso III, da CF , não pode o Superior Tribunal de Justiça avançar sobre o mérito da demanda com amparo no art. 515, § 3º, do CPC , sob pena de supressão de instância e de violação aos princípios constitucionais da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório.

Tal condição recursal não deve, em nenhuma hipótese, em sede de recurso especial, ser suprimida.

O apelo especial, portanto, possui como conditio sine qua non que a causa tenha sido examinada e decidida em única ou última instância, o que impediria a aplicação da teoria da causa madura. Por conseguinte, a utilização desta técnica de julgamento, pela instância especial, vedaria às partes a possibilidade do exercício do princípio do duplo grau de jurisdição, e a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça não estaria, desde que não tenha sido violado preceito constitucional, sujeita à revisão.

Assim, no afã de praticar a justiça, o Tribunal Superior teria praticado a mais grave das injustiças, que seria a mitigação forçada da ampla defesa e do contraditório.

Não obstante, existe no âmbito daquela Corte Superior posicionamento jurisprudencial divergente, o qual, por fidelidade intelectual, será a seguir retratado.


O Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, por exemplo, já admitia, antes do advento da Lei nº 10.352/2001 , a aplicação dessa técnica de julgamento, com amparo na aplicação analógica do art. 257 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.



Nesse sentido, transcrevo as palavras do ilustre Magistrado:



Por fim, no que concerne ao julgamento da causa, após o conhecimento do especial, tem ele previsão no Regimento Interno desta Corte, art. 257, não havendo empecilho de se decidir matéria imprequestionada, nos termos do Enunciado nº 456 da súmula/STF :


“O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa aplicando o direito à espécie.”
[ Omissis]
Com efeito, da interpretação que se faz do art. 105, III, da Constituição dessume-se que é da missão deste Tribunal o julgamento das causas que lhe são submetidas, não só a anulação dos acórdãos, como se tratasse de uma Corte de Cassação nos moldes europeus. Injustificável, desta forma, que, estando o processo maduro para ser decidido e já conhecido o recurso especial, seja anulado o aresto hostilizado para uma nova composição nas instâncias ordinárias.1212

12. Brasil. Superior Tribunal de Justiça, EDcl-REsp 36.849/RJ, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de 12.05.1997.


Seus defensores alegam, ainda, que a aplicação da teoria da causa em sede de recurso especial estaria prestigiando os princípios da celeridade, da economia e da efetividade do processo, conferindo-lhe, portanto, maior instrumentalidade.

Nesse diapasão:

RECURSO ESPECIAL - TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - AUTÔNOMOS, ADMINISTRADORES E AVULSOS - COMPENSAÇÃO - TRIBUTO DIRETO - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO NÃO REPASSE - INEXISTÊNCIA DE CAUSA MADURA - REEXAME NECESSÁRIO - ANÁLISE DOS DEMAIS PONTOS EM QUE O INSS RESTOU SUCUMBENTE - RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO
1 - A contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração de autônomos, administradores e avulsos é tributo direto, sendo, portanto, admissível a repetição do indébito ou a compensação, sem a exigência de prova da não repercussão do ônus tributário.
2 - Há jurisprudência nesta Corte no sentido de que, tratando-se de questão eminentemente de direito e estando a causa em condições de imediato julgamento, deve ser aplicada à espécie a teoria da causa madura, consagrada no art. 515, § 3º, do CPC , prestigiando-se, assim, os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade do processo, informadores do Direito Processual Civil moderno.
3 - Todavia, no caso dos autos, a r. sentença foi devolvida ao TRF da 3ª Região, por força de apelação interposta pelas empresas e de remessa oficial. Desse modo, os autos devem retornar ao Tribunal de origem, a fim de que esse proceda ao reexame necessário das demais questões decididas na r. sentença em desfavor da Autarquia Federal, nos termos do art. 475, I, do CPC . Isso porque somente àquela Corte compete o reexame da sentença nas questões em que restou sucumbente a Fazenda Pública, para dar efetividade ao duplo grau de jurisdição, sob pena de o julgamento deste Superior Tribunal de Justiça ensejar supressão de instância.
4 - Além disso, apenas as empresas interpuseram recurso especial. Assim, analisar os demais pedidos constantes deste recurso (índices de correção monetária, aplicação da Selic e limites percentuais à compensação) significa examinar apenas os pontos em que foram sucumbentes as empresas, deixando de lado questões decididas em desfavor da Autarquia Federal, o que suprimirá o duplo grau de jurisdição e, portanto, a possibilidade de ela obter a reforma da decisão, caso assim entenda o Tribunal de origem.
5 - Recurso especial parcialmente provido. Retorno dos autos à origem. (STJ, REsp 738.913/SP, 1ª T., Relª Min. Denise Arruda, DJU 31.08.2006 - grifei)





PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA - CRUZADOS BLOQUEADOS - CORREÇÃO MONETÁRIA - MANDADO DE SEGURANÇA - CABIMENTO - BTNF - CARÊNCIA DA AÇÃO AFASTADA - APRECIAÇÃO DO MÉRITO - ART. 515, § 3º, DO CPC
1 - Não há omissão do julgado se o Tribunal a quo aprecia suficientemente todas as questões postas em discussão nos autos para formação do seu convencimento.
2 - É cabível a discussão, em sede de mandado de segurança, sobre a determinação do índice aplicável à correção dos cruzados novos bloqueados em cadernetas de poupança, por ocasião do Plano Collor.
3 - Aplica-se o BTNF como índice de correção monetária dos saldos de cruzados novos bloqueados, a teor do disposto no art. 6º, § 2º, da Lei nº 8.024/1990 (EREsp 169.940/SC, Corte Especial).
4 - Afastada a carência da ação pela inadequação da via eleita, não há empeço a que esta Corte aprecie o mérito da controvérsia, que versa sobre matéria eminentemente de direito (cálculo da correção das cadernetas de poupança das contas à disposição do Bacen), evitando determinar o retorno dos autos à origem, em respeito aos princípios da efetividade do processo e da economia processual, conforme previsão do § 3º, art. 515, do CPC , acrescentado pela Lei nº 10.352/2001 , que possibilita ao Tribunal julgar, desde logo, todas as questões de direito discutidas no processo, ainda que não tenha sido apreciada em sua íntegra pela instância de origem.
5 - Recurso especial desprovido. (STJ, REsp 523.904/SP, 1ª T., Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU 24.11.2003, Rep. DJ 25.02.2004, p. 109 - grifei)
A matéria, portanto, concluindo, em que pese os argumentos apresentados, encontra-se notoriamente divergente, no que tange ao recurso especial, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça1313

13. Em sentido favorável à aplicação do art. 515, § 3º, do CPC ao recurso especial: REsp 738.913/SP, 1ª T., Relª Min. Denise Arruda, DJ 31.08.2006; REsp 821.122/PR, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ 03.08.2006; REsp 523.904/SP, 1ª T., Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 24.11.2003; AgRg-REsp 869409/SP, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, DJ 03.08.2007; REsp 554.876/RJ, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 03.05.2004; e, REsp 469.921/PR, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 26.05.2003.





Em sentido desfavorável à aplicação do art. 515, § 3º, do CPC ao recurso especial: REsp 768.523/RJ, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJ 28.05.2008; AgRg-REsp 346.663/MG, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ 04.03.2002; REsp 919.689/RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJ 28.05.2007; REsp 884.584/SP, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJ 07.02.2008; AgRg-Ag 631.139/SP, 2ª T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 29.08.2005; e REsp 723.918/RN, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 20.06.2005.





CONCLUSÃO

O estudo da matéria foi dividido, à luz da atuação recursal do Superior Tribunal de Justiça, em duas frentes: a primeira é relativa ao recurso ordinário em mandado de segurança e a segunda é pertinente ao recurso especial.

O tema, decerto, é relevante e interessantíssimo, pois, como se sabe - e restou anteriormente asseverado ( v.g., STJ, EDcl-REsp 36.849/RJ, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 12.05.1997) -, a origem e a aplicação da teoria da causa madura (também conhecida como “ julgamento per saltum” - isto é, julgamento do meritum causae da ação extinta pelo Juízo ad quem) são anteriores à modificação promovida no sistema processual pátrio pelo advento da Lei nº 10.352/2001 - a qual alterou o capítulo relativo ao recurso de apelação no Código de Processo Civil .

Com efeito, a novel legislação teve por mérito o fato de expressa e legalmente acolher a presente tese, cuja origem, na verdade, firmou-se na praxe forense pelos Tribunais de Justiça estaduais, os quais procuravam prestar maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional.

Em síntese, a aplicação da teoria da causa madura é permitida aos julgadores quando superada, em sede de duplo grau de jurisdição, uma das situações previstas no art. 267 do Código de Processo Civil - cuja ocorrência conduz o processo à extinção sem resolução de mérito (sentença terminativa).

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, esta técnica de julgamento ganha contornos peculiares.

Relativamente ao recurso ordinário constitucional em mandado de segurança, por guardar similitude procedimental ao recurso de apelação, por força de sua própria lei de regência, não há qualquer empecilho em aplicar nesta seara recursal a teoria da causa madura pelo STJ.

Todavia, no tocante ao recurso especial, a matéria se torna um pouco mais complexa.

Possuindo pressupostos recursais próprios, o recurso especial tecnicamente não admite a aplicação da técnica de julgamento per saltum.

Primeiro, porque, se a matéria não tiver sido prequestionada na origem, não poderá o Superior Tribunal de Justiça examiná-la, sob pena de se transformar em instância ordinária, além de, por lógico, suprimi-la indevidamente.

Segundo, porquanto o apelo especial, para ser conhecido, necessita que a demanda tenha sido decidida em única ou última instância ( art. 105, inciso III, da Constituição Federal ), para que seja assim instaurada a competência recursal em grau especial.

Por conseguinte, a utilização desta técnica de julgamento, em sede de recurso especial, vedaria às partes a possibilidade do exercício do princípio do duplo grau de jurisdição e a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça não estaria, desde que não tenha sido violado preceito constitucional, sujeita à revisão.





Não obstante os argumentos anteriormente sustentados, mediante a análise de precedentes jurisprudenciais, foi alertada a existência de divergência sobre o presente tema no âmbito do STJ.





Os que defendem a sua aplicação prestigiam, em suma, os princípios da celeridade, economia e efetividade do processo, conferindo-lhes, portanto, maior instrumentalidade.





A polêmica, entretanto, tende, ao menos no momento, a permanecer no cotidiano daquela Corte Superior.







REFERÊNCIAS



BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-Ag 631.139/SP, 2ª T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU 29.08.2005.





______. Superior Tribunal de Justiça, RMS 15877/DF, 1ª T., Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU 21.06.2004; RePro, v. 119, p. 187.





______. Superior Tribunal de Justiça, AgRg-REsp 346.663/MG, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJU 04.03.2002.





______. Superior Tribunal de Justiça, EDcl-REsp 36.849/RJ, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 12.05.1997.





CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. 2, 2007.





CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso especial, agravos e agravo interno. Rio de Janeiro: Forense, 2001.





DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil. 7. ed. Salvador: JusPodivm, v. 3, 2009.





FIGUEIREDO TEIXEIRA, Sálvio (Coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991.





MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao código de processo civil - Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, v. V: artigos 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 2006.





NERY JÚNIOR, Nelson (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: RT, 2002.





PIMENTEL SOUZA, Bernardo. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.





PINTO, Nélson Luiz. Manual dos recursos cíveis. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.





ROENICK, Hermann Homem de Carvalho. Recursos no código de processo civil. Rio de Janeiro: Aide, 1999.











Observação Editorial Síntese

1) As opiniões publicadas neste artigo são de exclusiva e integral responsabilidade do(s) autor(es), não refletindo, necessariamente, a opinião do Editorial Síntese.

















Referência eletrônica desta doutrina:

Autor: Fernando Natal Batista Título: A APLICAÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA NO ÂMBITO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 9.1.2012



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